Benvindo

Este deverá ser um espaço onde amigos compartilhem suas criações e as discutam. Se desejar entre em contato para discutirmos o desenvolvimento do blog e participações. delbenbr@hotmail.com

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Realismo



Metafísica? Que metafísica têm as árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos e a de dar fruto na sua hora.
Alberto Caeiro
 
 
      Se a perna da cadeira quebrou, então a perna da cadeira quebrou. Todas as considerações a respeito disto são subjetivas, não mudam o fato. Se foi quebrada por acidente ou intenção, se advêm de uma postura inadequada de quem nela senta e se esta postura é decorrente de uma postura psicológica ou emocional recorrente daquele que senta, é totalmente irrelevante. Esta linha de raciocínio leva a mais subjetividades projetadas da própria personalidade de quem considera o fato. Neste caso a conclusão na maioria das vezes revela mais a respeito do avaliador do fato que dos fatos em si ou seu causador. Puro exercício de inutilidades. Se a perna da cadeira quebrou resta julgar se vale a pena consertá-la ou não e, em seguida, decidir se vai consertá-la ou não. Todo o resto é pura estupidez. Maior estupidez ainda é tecer considerações sobre o fato de se estar tecendo considerações sobre o fato que alguém tece considerações sobre o fato que a perna da cadeira quebrou. A perna da cadeira simplesmente quebrou.

The Broken Chair by Can Berkol





José Renato

06/12/2010

sábado, 2 de outubro de 2010

Estou perdendo tudo


Estou perdendo tudo. Eu trinco, eu racho, eu caio aos pedaços. Acumulei tantas coisas no fundo dos olhos! Há tantos sons sonantes e dissonantes armazenados nas cavernas dos ouvidos. Os sabores que tive, tenho e terei rolam entre o céu da boca e a terra da língua. As pulsões atemporais se agarram com unhas e dentes no baixo ventre. Tudo isto era completude e fragmentação. Agora são vãos tesouros ainda desejados.
A solidão é quando se vão ou quando me afasto? Na distância além não me acho e me encontro quando me distancio aquém. Mas a barreira de todas as coisas me deixa de fora para fora.
Estou perdendo o saber. Das luzes acumuladas atrás do fundo dos olhos só sai perplexidade, tristeza e um pouco de ternura. Dos sons guardados no mais fundo que o fundo do ouvido, da caverna desconhecida para além da garganta, saem algaravias, dúvidas ou silêncio. Quando falo é outro que fala e quando olho nem sei.
Estou perdendo a liberdade. Os pedaços de lama ressequidos ao sol do tempo, conceituados de todas as coisas acumuladas, se desprendem de minha pele abandonados pelo caminho. Quanto mais caio aos pedaços, mais de mim aprisionado me acho. E eu sou tirânico.
Estou perdendo a capacidade de definir. Aguardo agora com tristeza a definitiva conclusão.

sábado, 18 de setembro de 2010

O que no poema não há é o mais importante que há.


José Renato
18/09/2010
Ver luz intensa na escuridão de um poema.
Adquirir sabedoria na ilógica dos versos
tortos em linhas mosaicas, tão certas.
Encontrar felicidade no profundo poço,
estagnado em cinza chumbo na alma.
Estar tão cheio e completo
que o vazio preenche cada vilosidade
do nada.






José Renato
18/09/2010

domingo, 29 de agosto de 2010

Vosso

Você? Você!
Vou ser,
ser vosso,
vosso servo,
sem voz.
José Renato
29/08/2010

domingo, 22 de agosto de 2010

Óbvios

Um bom omelete se faz quebrando alguns óbvios.

José Renato
22/08/2010

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Bonsai

Ontem aniversariei. Fiz tantos anos que possuo uma grande paisagem para apreciar pela qual atravessou meu caminho, já bem maior que a paisagem que vejo adiante. Sou mais afeito hoje a pensar e repensar o caminho do passado e os caminhos do futuro. Acho que é da idade. Mas....
Um grande amigo não trouxe vinhos desta vez, que teria aberto no ato e apreciado com amigos e amigas comungando nossas vidas e caminhos. Trouxe-me um bonsai. Que lhe deu para me presentear com isto? Adoro jardins, mas não cuido deles e um bonsai precisa de cuidados especiais. E especialmente nem de mim cuido bem. Só serviu para demonstrar o seu apreço e provocar coceiras no orgão pensante. Me “garrei” pensando na miséria daquele ser vivente e na sua contraparte plantada no quintal.
Aquela planta era o simbolo perfeito de dedicação disciplinada à estética. Havia muito amor à arte naquilo, mas pouco amor à planta em sí. Tinha sido escolhida com muito cuidado e apreço e era uma peça de beleza rara. Pequenina, saia de um pequeno torrão de terra em forma de uma miniatura de monte coberto com musgo. Retorcia-se em curvas elegantes até gerar minusculos galhos floridos também graciosamente curvados. O artista guiou seu desenvolvimento rigorosamente para simular a falta de simetria da natureza, mas tornando-a elegante e bela. Contrariou todos os potenciais inatos daquele ser para torná-lo mais perfeito do que seria. Via-se claramente que era artificial
A mangueira da mesma espécie e idade do bonsai plantada no quintal, por outro lado, é enorme e cresceu como quis. Todo ano “suja” o quintal com folhas, flores ou frutos caidos. Estes resíduos do seu crescimento e fertilidade se decompõem, cheiram e atraem insetos e pássaros. Estamos sempre em risco de receber uma manga na cabeça e, mais raramente, um galho se o dia for ventoso. Está sempre nos dizendo: cuidado comigo. Mas, quando é época de nos dizer o quanto é generosa se carrega de frutos e nos dá mais do que podemos receber. Cresceu como quis e faz o que quer, até uma calçada tentou levantar e tivemos que reprimi-la com ferramentas. Abusada e cheia de personalidade, dá trabalho. Faz sombra também sobre musgos, como o bonsai, mas também sobre nós e sobre outras plantas. Abriga pássaros, insetos e pequenos animais. É rica em defeitos e qualidades, mas uma qualidade posso garantir que não possui: a estética.
É certo que teve que ser podada algumas vezes, mas só se os galhos estivessem crescendo para qualquer lado que a prejudicasse ou aos outros moradores da casa. E isto sem cuidados especiais, cortava-se e pronto. Certo também que teve que ser regada e adubada em sua fase inicial de crescimento. Depois que cresceu virou-se sozinha. Água teria que vir das profundezas do solo, luz das alturas do céu, podas da generosidade do vento. Mas todo o seu potencial foi deixado realizar-se mesmo que crescesse certo aqui e torto ali, como devia ser. A falta de solo de um bonsai a torna raquitica, pobre, inválida, perfeita.
O que faz alguém preferir uma pequena árvore? O medo do seu tamanho potencial, e isto é fragilidade? A preferência por um trabalho criativo que a faz apreciar a sua própria criatividade e não a da planta, e isto é egoísmo? O prazer de moldar a natureza segundo sua própria vontade, e isto é prepotência? O gosto exclusivo pela beleza pura, e isto é descuido?
Não sei o porque, mas me dá uma pena enorme.

José Renato 09/07/2010

domingo, 9 de maio de 2010

Num dia é assim,
n'outro é assado.
Num dia é afim,
n'outro, passado.

José Renato, 09/05/2010

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Há brilhos

No meu olhar há brilhos. Há brilhos de infância, de juventude fora dos trilhos em paixões e ansias, de entusiasmo juvenil pela conquista intelectual do mundo, de paixões mais densas e vermelhas de homem e amor vibrante, de sonhos loucos de maturidade e amores calmos contraditando e de entendimentos e revoltas, e de tantas coisas que fazem vibrar o coração, a mente e a alma de um homem.
Hoje, no meu olhar, há brilhos mais intensos que nunca. São aumentados por pequenas lentes líquidas formadas pela consciencia dos fracassos e uma tristeza infinita, que magnificam todas as dores e prazeres de uma vida.
Agora, até nas minhas faces há fios de luz perturbados por escuridão. São correntes que lavam e trazem para fora partes da minha Sombra.

José Renato
02/04/2010

quinta-feira, 4 de março de 2010

Beleza

Há a beleza! Vemos um por do sol colorido de dar dó de sua brevidade e pensamos que é uma benção de Deus ou da natureza. Um campo florido, ainda mais se cultivado, gera extases e achamos ser uma dádiva. Ao contrário se há secas ou enchentes, tempestades, frios e calores em excesso achamos que é castigo pela maldade humana e há feiura. Nascimento é belo e morte é feia, mas vida é nascimento e morte.
Tudo é absolutamente belo porque a finalidade de tudo é para que apenas Um se divirta. Basta definir este Um. Clarice disse algo parecido com: se formos felizes, e depois? Há o que? Há que mudar tudo o tempo todo. E o Homem?! Bah, o Homem!
José Renato 04/03/2010

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Hoje me dói

Verifico que, tantas vezes alegre, tantas vezes contente, estou sempre triste.

Não há sossego - e, ai de mim!, nem sequer há desejo de o ter.

Fernando Pessoa - Bernardo Soares



Hoje me dói.
Me dói uma dor que dói em mim.
E não sou mais que isto.
Dói tamanho que nem sei.
Há uma fratura.
Tão eu que há abismo.
Ninguém mais há,
Deus há a distância.
Deserto. E Oásis eu não sou.



José Renato Delben, 18/02/2010