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sexta-feira, 9 de julho de 2010

Bonsai

Ontem aniversariei. Fiz tantos anos que possuo uma grande paisagem para apreciar pela qual atravessou meu caminho, já bem maior que a paisagem que vejo adiante. Sou mais afeito hoje a pensar e repensar o caminho do passado e os caminhos do futuro. Acho que é da idade. Mas....
Um grande amigo não trouxe vinhos desta vez, que teria aberto no ato e apreciado com amigos e amigas comungando nossas vidas e caminhos. Trouxe-me um bonsai. Que lhe deu para me presentear com isto? Adoro jardins, mas não cuido deles e um bonsai precisa de cuidados especiais. E especialmente nem de mim cuido bem. Só serviu para demonstrar o seu apreço e provocar coceiras no orgão pensante. Me “garrei” pensando na miséria daquele ser vivente e na sua contraparte plantada no quintal.
Aquela planta era o simbolo perfeito de dedicação disciplinada à estética. Havia muito amor à arte naquilo, mas pouco amor à planta em sí. Tinha sido escolhida com muito cuidado e apreço e era uma peça de beleza rara. Pequenina, saia de um pequeno torrão de terra em forma de uma miniatura de monte coberto com musgo. Retorcia-se em curvas elegantes até gerar minusculos galhos floridos também graciosamente curvados. O artista guiou seu desenvolvimento rigorosamente para simular a falta de simetria da natureza, mas tornando-a elegante e bela. Contrariou todos os potenciais inatos daquele ser para torná-lo mais perfeito do que seria. Via-se claramente que era artificial
A mangueira da mesma espécie e idade do bonsai plantada no quintal, por outro lado, é enorme e cresceu como quis. Todo ano “suja” o quintal com folhas, flores ou frutos caidos. Estes resíduos do seu crescimento e fertilidade se decompõem, cheiram e atraem insetos e pássaros. Estamos sempre em risco de receber uma manga na cabeça e, mais raramente, um galho se o dia for ventoso. Está sempre nos dizendo: cuidado comigo. Mas, quando é época de nos dizer o quanto é generosa se carrega de frutos e nos dá mais do que podemos receber. Cresceu como quis e faz o que quer, até uma calçada tentou levantar e tivemos que reprimi-la com ferramentas. Abusada e cheia de personalidade, dá trabalho. Faz sombra também sobre musgos, como o bonsai, mas também sobre nós e sobre outras plantas. Abriga pássaros, insetos e pequenos animais. É rica em defeitos e qualidades, mas uma qualidade posso garantir que não possui: a estética.
É certo que teve que ser podada algumas vezes, mas só se os galhos estivessem crescendo para qualquer lado que a prejudicasse ou aos outros moradores da casa. E isto sem cuidados especiais, cortava-se e pronto. Certo também que teve que ser regada e adubada em sua fase inicial de crescimento. Depois que cresceu virou-se sozinha. Água teria que vir das profundezas do solo, luz das alturas do céu, podas da generosidade do vento. Mas todo o seu potencial foi deixado realizar-se mesmo que crescesse certo aqui e torto ali, como devia ser. A falta de solo de um bonsai a torna raquitica, pobre, inválida, perfeita.
O que faz alguém preferir uma pequena árvore? O medo do seu tamanho potencial, e isto é fragilidade? A preferência por um trabalho criativo que a faz apreciar a sua própria criatividade e não a da planta, e isto é egoísmo? O prazer de moldar a natureza segundo sua própria vontade, e isto é prepotência? O gosto exclusivo pela beleza pura, e isto é descuido?
Não sei o porque, mas me dá uma pena enorme.

José Renato 09/07/2010